Schaffer Advogados

As alterações na legislação acerca de armamento ampliaram o acesso às armas e munições? Houve alteração em relação ao porte de armamentos no Brasil?

Por Giuliano Togni Valduga

Os decretos que regulamentam a posse e o porte de armas no Brasil, como o Estatuto do Desarmamento (Lei 10.826/2003), ampliam o acesso às armas e munições no país ao cidadão comum. Com as alterações propostas ocorreu o crescimento pela procura por informações e procedimentos necessários para obter o direito ao porte. Mas você sabe quais foram as mudanças na legislação que trata sobre esse tema?

De acordo com o especialista no assunto, Giuliano Togni Valduga (OAB 47.953), da Schäffer Advogados, de Lajeado/RS, antes de abordar o tema é necessária uma distinção imposta pela própria legislação acerca de “posse de arma” e “porte de arma”, bem como se a pessoa que a postula é um cidadão comum ou membro de uma das categorias profissionais expressamente previstas em lei.

Neste artigo, em razão do maior interesse quanto ao assunto, as informações abordarão apenas o direito à porte e à posse pelo cidadão comum (excluindo Forças de Segurança, Magistratura e outras categorias previstas em normas esparsas). O regramento quanto ao porte de arma de fogo para o cidadão comum permanece inalterado para obtenção da licença, prevalecendo as disposições da Lei 10.826/03 e a Instrução Normativa nº 201/2021 DG/PF da Polícia Federal.

Diferenças de posse e porte de arma

O advogado explica que a posse de arma se caracteriza pelo direito do cidadão comum ter junto a si, em um local declarado para a autoridade competente, que pode ser sua residência ou seu local de trabalho (desde que seja o responsável pelo mesmo), uma arma para defesa. Não é possível transitar com essa arma (salvo com uma guia de trânsito expedida pela Polícia Federal para fim declarado pelo proprietário da arma, que possui tempo de validade e itinerário).

Já o porte de arma, sintetiza Valduga, é caracterizado pela necessidade do cidadão devido ameaças sofridas ou por exercer atividade de risco não contemplada no art. 6º da Lei 10.826/03, para sua defesa própria ou de terceiro. Em relação ao porte de arma, o cidadão poderá estar com a arma consigo em trânsito. A arma não necessita estar em um local previamente declarado.

Munições

Quanto às munições, uma vez de posse do porte de arma de fogo, registro da própria arma e da identificação do portador, as munições, que devem ser do mesmo calibre da arma e em número compatível, estão autorizadas ao transporte. O limite máximo de munições a ser adquirida por ano é de 200 unidades.

Quem tem direito ao porte de arma?

Desde 2019, houve a edição de seis decretos sobre armamentos no país. Destes, um foi revogado (Decreto 9.785/19), um foi alterado 9.846/19 e quatro estariam com a eficácia parcialmente suspensa por força de liminares deferidas em Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs), proferidas pelo STF, pendentes de decisão pelo Plenário da Corte (Decretos 10.627/2021; 10.628/2021; 10.629/2021 e10.630/2021). Deste modo, atualmente, a matéria está regulada pela Lei 10.826/03 e pelas partes não atingidas pelas liminares deferidas pelo STF.

Segundo o advogado, a autorização para o porte de arma de fogo de uso permitido está prevista na Lei nº 10.826/03, em seu art. 10, sendo que o art. 6º, da mesma lei, estabelece que: “É proibido o porte de arma de fogo em todo o território nacional, salvo para os casos previstos em legislação própria.” Nesse contexto, o porte de arma de fogo é uma exceção e somente será deferida ao cidadão comum que demonstrar à Polícia Federal sua efetiva necessidade em razão do exercício de  atividade profissional de risco ou de ameaça à sua integridade física.

Além disso, a pessoa deve comprovar sua idoneidade, apresentando certidões negativas de antecedentes criminais fornecidas pela Justiça Federal, Estadual, Militar e Eleitoral, ter 25 anos ou mais, e não responder a inquérito policial ou a processo criminal.

Também deverá apresentar documento comprobatório de ocupação lícita e de residência certa, e comprovar capacidade técnica e aptidão psicológica para o manuseio de arma de fogo, além do registro da arma de fogo em seu nome.

Por fim, o portador da licença, além de estar proibido de ingressar com a arma de fogo em locais onde se encontrem várias pessoas, como, por exemplo, agências bancárias, templos religiosos, estádios de futebol, deve estar atento ao fato de que a autorização de porte de arma de fogo perderá automaticamente sua eficácia caso seja detido ou abordado em estado de embriaguez ou sob efeito de substâncias químicas ou alucinógenas.

Como os novos decretos impactam na procura pelas autorizações de porte?

O advogado reforça que a situação do porte de arma se mantém, atualmente, inalterada. Apenas de forma excepcional, pessoas que cumprirem os requisitos estabelecidos pela legislação é que poderão ter o porte de arma deferido, para defesa de sua integridade física. “Contudo, em razão das discussões que estão sendo travadas tanto no Congresso Nacional, quanto no Judiciário, é temeroso se fazer qualquer afirmação sobre o tema”, salienta.

De qualquer forma, o porte de arma de fogo é proibido no Brasil. Apenas de forma excepcionalmente, pessoas que cumprirem os requisitos estabelecidos pela legislação poderão ter o porte de arma deferido, para defesa de sua integridade física. “Cabe o registro de que o custo financeiro para se ter o porte de arma é elevado, o que é um fator limitador, que deve ser considerado pelo cidadão antes de dar início ao procedimento de obtenção da referida autorização. Essa autorização pode ser revogada a qualquer tempo pela autoridade, caso o autorizado não cumpra com as normas legais em vigor.”

O que se tem percebido, conforme Valduga, é um movimento das pessoas que exercem profissão em que há risco a sua integridade física ou que sofreram ameaças, na busca da obtenção do porte de arma, solicitação que passa por uma análise criteriosa da autoridade que analisa os argumentos e as provas fornecidas pelo cidadão e, após o devido processamento, defere ou indefere o pedido.

É bom deixar claro que não é permitido o porte de arma longa de fogo (espingarda, fuzil, rifle, carabina e etc.) para o cidadão comum, a esses é apenas permitido o porte de revólver e pistola de calibres permitidos.

Que principais fatores têm levado as pessoas a buscar pelo direito de ter armas em casa?

“Essa postura demonstra a intensão da população em exercer o direito à legítima defesa, como meio para assegurar o próprio direito à vida. Não há como discordar da afirmação de que o Estado não consegue estar presente em todo lugar, a todo o tempo, para proteger os cidadãos. Não há direito à legitima defesa, sem os meios aptos para exercê-la”, enfatiza o advogado.

Além disso, salienta, uma pessoa treinada e capacitada para o manuseio de arma de fogo, consegue repelir, de forma eficaz, a prática de violência contra sua vida e/ou de sua família. “Muitas vezes, esta pessoa é a única linha de defesa de sua família. Portanto, tolher o direito de acesso a meios eficazes de produzir a defesa própria e de terceiros significa negar vigência ao princípio constitucional da legitima defesa e, mais uma vez, do próprio direito à vida.

Estudos americanos

Ainda, conforme Valduga, é preciso observar que o único meio de equiparar as forças de um agressor maior e mais forte, com uma vítima menor e mais fraca, é a arma de fogo. “Temos como exemplo um estudo do professor Benê Barbosa, realizado nos Estados Unidos, pelo Departamento de Justiça Norte-Americano, denominado ‘Law Enforcement Assistance Administration, Rape Victimization in 26 American Cites’, feito com mulheres que foram alvo de tentativa de crimes sexuais, nas 26 maiores cidades americanas. Nele, ficou demonstrado que, em 97% dos casos de tentativa de estupro, quando a mulher está armada, treinada e reage, a agressão é repelida. Em outras palavras, em cada 100 tentativas de estupro, apenas três ocorreram. Neste caso, o bom uso do armamento foi determinante.”

O advogado cita ainda outra pesquisa realizada pelo Instituto Nacional de Justiça dos EUA, com criminosos condenados, de todo o país, que constatou que 74% deles têm medo de serem baleados por uma vítima e desistem do ataque quando percebem que estão lidando com alguém armado. “Estas pesquisas são trazidas das experiências de outros países, porque no Brasil, infelizmente, não possuímos um arcabouço de pesquisas sérias acerca do tema. Não há uma parametrização das pesquisas dividindo por campos os homicídios. Aqui, se põe no mesmo contexto os homicídios cometidos por criminosos com armas ilegais e àqueles produzidos dentro de um contexto de legítima defesa.”

Referendo do desarmamento

Valduga acredita que os brasileiros entenderam que é legítimo o acesso da população aos meios de defesa eficazes e que o armamento na mão de pessoas de bem trazem mais benefícios do que prejuízos. “Tal afirmação foi feita no referendo do desarmamento em 2005, onde 64% da população brasileira disse ser favorável à comercialização de armas no Brasil. Portanto, a alteração legislativa de 2019, que autorizou a posse da arma mediante declaração de efetiva necessidade, vem ao encontro da vontade da população, já expressa em 2005.”

Nesse contexto, ele enfatiza que não é a proibição de armas lícitas que evita a violência. “Na Cidade do Rio de Janeiro, por exemplo, é proibida a abertura de lojas de armas e no Estado do Rio de Janeiro, de fábricas de armas. Porém, é de lá que vemos os casos da utilização de armas ilegais (armas automáticas, por exemplo, que são proibidas, à exceção das Forças Armadas), aterrorizando tanto os órgãos de Estado, quanto a população civil, que sequer pode comprar uma arma na sua cidade para defender a si e sua família”, compara.

Por fim, o advogado reforça que o dever do Estado em prover a segurança dos cidadãos não é visto na prática. “O que a sociedade tem experimentado é um baixo índice na resolução de crimes e a presença do Estado, através das forças de segurança, geralmente, após a ocorrência do delito. Assim, ter em casa uma arma, estar capacitado e treinado, dá ao cidadão, ao menos, a chance de se defender de agressões que venha a sofrer ou de proteger sua família. Caso não tenha acesso a tal meio de defesa, restará abandonado à própria sorte.”

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